segunda-feira, 31 de maio de 2010

O Reencontro*


Confesso que temi, em certo grau, esse reencontro. Não mais do que ansiei, é verdade. Medo da mudança. Das coisas que poderiam ter deixado de existir. Medo da boca não ser mais tão macia, como na minha lembrança. Do encaixe não ser realmente tão perfeito. Da fantasia ter superado a realidade e criado algo que nunca existiu.

Pois bem, medo infundado. Tudo continua como antes. As mãos, com aquela textura que nunca vi igual em outra mão. A boca, que me leva à loucura onde quer que toque. Que beije. E o cheiro.. o cheiro, mais do que tudo, tem me embriagado desde que voltou. Ele sobe pelo meu nariz e envolve, me chamando, me prendendo. Me dizendo: vem ser minha. Quando tudo que eu consigo pensar é, "eu já sou". O que com qualquer outro se torna banal, contigo é quase sagrado. Minutos preciosos, insubstituíveis. Até o gozo se torna secundário, se é pra você que eu posso sorrir quando tudo acaba.

Tudo continua o mesmo. O sorriso maroto. A risada engraçada. O abraço apertado. E principalmente, a inatingibilidade do teu 'eu'. Tudo lá, exatamente como eu deixei um ano e meio atrás. Nada mudou, até mesmo o fato de você me querer apenas por algumas horas e nada mais.

* O excelente romance ( 2009) é de Jéssica Ramos, a blogueira do: Inconstante.

segunda-feira, 24 de maio de 2010

Palavras não ditas









Pelas palavras que ainda surgirão

Promessas de amor ou rompantes de razão

Já não se sabe mais o que pronunciar

Cada palavra pensada

É outra deixada no ar

Pelas palavras que ainda não balbuciei

As que esqueci, as que escondi, as que 'inda hei

De um dia quem sabe revelar...

A todas elas... por todas elas...

Espero o tempo correto, exato

Pra falar... ou então...

Calar se for preciso

Num olhar, numa lágrima

Ou, melhor ainda... num sorriso.


Thais Carvalho

quinta-feira, 20 de maio de 2010

Breve Despedida

Amado, amigo, amante. Amado amigo amante.

Já amanheceu aqui, nesta terra distante que é meu quarto. Nesse quarto vazio de ti. Já amanheceu e eu não durmo, por esperar esse amanhecer frio que me traz remotas lembranças de um tempo só teu.

Há tanta força aqui, não vê? Há carinho e cuidado, há o sopro eterno do amor que lhe dedico assim, à distância, essa distância breve e avassaladora que impus para não te perder em definitivo. Há o perdão pelas palavras duras que disseste, sei o que te assola, conheço teus caminhos. Como haveria de não perdoar? Há dores imensas, ora, aceito a condição humana. Mas há um bem-querer de sempre, a ti e a mim. Há sempre fé.

Pequenas magias, eu sempre disse, lembro-me com clareza. Sinto teu sorriso antigo como se fosse de ontem, por que te escondes? Sai desse canto obscuro, vem caminhar comigo em silêncio. Vem ver quanta vida tem lá fora e aqui dentro de mim. Não te prives de mim, é o que te peço em súplica rascante. Mas não me devaste o peito assim, sem reserva. Não te insurjas contra mim com o peito aberto à morte e a face aberta ao tapa. Não me venhas como animal sangrando de feridas velhas. Tampouco me julgues por buscar verdade na vastidão do meu coração. Sei a medida exata dele, aqui não há sobras.

Amor meu, deixemos de nos lanhar por alguns pequenos instantes, para que a Divina Providência me mostre que não lutei por guerras vencidas, de tempos imemoriáveis. Para que eu saiba que meu prêmio de consolação não há de ser o desapego. Não, não estou a abandonar-te, nem a mim mesma, estou deixando em suspenso aquilo que me é mais caro, o tempo nosso, paro o tempo no tempo em que ainda temos um ao outro, antes que a chuva termine por levar de nós o que é só nosso, antes que deixemos de ser só um...inelutavelmente.

Amado amigo amante...vou me deitar à sombra. Aceite essa breve despedida. Fecho as cortinas agora, mas deixo para ti uma fresta da minha alma. Deixo sobre o balcão a melhor parte de mim, com o aviso de sempre: manuseie com cuidado, existe vida aqui dentro.

Escrito em setembro de 2007

quinta-feira, 13 de maio de 2010

conto

Ele a pegou em seus braços, deu-lhe um longo e profundo beijo, daqueles onde se sente a despedida como uma troca doce de sentimentos confusos e amedrontados pelo desconhecido. As pernas tremeram, mas o corpo forte daquele homem lhe dava base para se sustentar, ela sabia que aquele momento poderia ser o ultimo junto ao corpo do seu amado.


Ele a olhou nos olhos e disse “eu era como um pássaro, estava sempre a voar livre sem nenhum vínculo com a terra, mas depois que te conheci, as minhas asas passaram a ter somente uma direção, que é voar sempre para você, assim como meu coração”.


As lágrimas corriam em seu rosto, como ladrões no camuflar da noite esperando o momento certo para atacar. Ela sabia que a única forma dele a deixar, seria lutando em uma guerra, sabia que cedo ou tarde, aquela guerra poderia alcançá-la, logo, ele jamais permitiria isso.


Aqueles passos em direção a porta eram escoltados pelas batidas fortes do coração dela, era desesperador ver a única pessoa de sua vida partir, era como de repente acordar sem metade do corpo.


Quando ele abriu a porta, ela não agüentou. Correu como uma criança perdida que acaba de encontrar seus pais em meio a uma multidão. E o abraçou, entranhando suas unhas no grosso casaco, apertando suas pernas nas dele, juntando cabeça com cabeça numa perfeita união de corpos, que só acontece no abraço.


Numa ultima tentativa desesperada ela disse “você já perdeu essa guerra, pois quando você sair por esta porta, eu já estarei morta. Se você pretende morrer por mim, que seja ao meu lado me protegendo e assim, se o inimigo o acertar, estarei pronta para ir junto com você”.


Ele deixou a arma cair, e um vento forte e impetuoso entrou escancarando a porta rente aos dois, ambos olharam para aquela cena. Aqueles longos e lisos cabelos loiros aterrissaram sobre os olhos vermelhos de dor, cobrindo uma parte do medo que ali existia.


Ele olhou durante algum tempo para o que tinha além daquela porta, ainda sentindo o corpo da sua amada no seu, virou o rosto de encontro ao dela, tirou gentilmente aquelas mechas loiras revelando lindos olhos castanhos, a beijou como nunca havia beijado antes, e em seguida, fechou a porta e tudo que havia fora dali não era nada comparado ao que ficara dentro daquela casa.


Trecho tirado de um conto que escrevi em 2007

terça-feira, 11 de maio de 2010

Anedotas de um momentâneo desventurado outrora amado II – Reduza a velocidade do querer bem

¡Atención, compañeros & compañeras! É chegado o momento de empunharmos o martelo da indignação, quebrarmos o vidrinho do “deixa pra lá” e acionar o alarme de emergência das afeições. Os amores estão cada vez mais voados. Nada contra em apressar o que é bom, mas o estrago reside no enrosco passar mais lotado que os ônibus do Manoel Julião a partir das seis da noite. A denúncia é a seguinte: o amor está cada vez mais fast e menos food.

Os relacionamentos vanguardas seguem o esquema da pirâmide invertida, com lead e tudo mais. Vem tudo logo no começo. Cariños, besos, sexo dos deuses, telefonemas não atendidos, tédio, brigas e término, tudo no primeiro parágrafo dessa matéria. Cabou-se o amor literário. Não se fazem mais histórias amorosas complexas. Tudo que tem pra acontecer, acontece numa lapada só.

Sem saber como, todos os dias temos várias quebras de recordes em velocidade entre o primeiro olhar coisado e a primeira DR. Fica claro que estamos lidando com o dopping da objetividade. A queima da largada do afago. Que pecado...

Minha linda e meu camarada, vos digo: chega dessa pressa. Curtam com mais demora a fase do frio na barriga por não saber o que se passa na cabeça do pretenso cônjuge. Vivemos um dá ou desce do coração tão desnecessário quanto estúpido... Vá devagar, devagarinho como diz o sambista.

Até entendo o porquê desse arreto todo em busca do amor da vida inteira. É bom e queremos logo. Mas cuidado, pois tal qual um carro a 160km/h nas curvas da estrada de Santos, quando se puxa o freio de mão da decepção, a capotagem sentimental é inevitável.

domingo, 9 de maio de 2010

O Calendário

Ganhei um belíssimo calendário, fruto de uma viagem que uma amiga fizera a África. Seu presente decora a pálida parede amarela do meu quarto e o formato requer que todo mês eu vire sua página verticalmente, e mude a foto ilustrativa.

O fato é que essa mudança está sendo cada vez mais rápida. Em instantes o filhote de leopardo deu lugar ao gigante elefante, e não me lembro de em nenhum momento ter consultado o fim de semana de lua cheia, ou que dia era 14.

O exercício de escrever sobre coisas tão complexas (e que de antemão me considero ignorante) como relacionamentos, paixão, amor e a busca da felicidade, tem me feito desenvolver uma qualidade essencial: a atenção.

O estado de alerta está acionado! Vejo os detalhes das mãos dadas, a resposta ríspida do casal em crise, as premonições dos especialistas em relação alheia, a beleza do romantismo na praça, os dias que passam voando, e observo ainda, com ar de desaprovação, a senhora Rotina com sua fantasia de morte.

Mas o alerta tem andado junto com a paciência, com a sabedoria adquirida de que tudo, de uma forma ou de outra, acaba se ajeitando, de saber que as soluções fáceis não existem e que cada minuto tem seu valor.

Ao perceber que tudo é feito de pequenos grandes detalhes, faço a opção de digitalizar cada pensamento, memorizar intenções e tentar de alguma forma transmitir emoções. Não posso prever quanto tempo durará esse estado de alerta, ou até quando cultivarei a sábia paciência, mas ao compartilhar idéias, aprendendo a utilizar os mais variados métodos e linguagens, tenho a impressão de que presencio, na verdade, um estado de espírito.

Nesse instante volto ao calendário, e folheio as figuras dos meses anteriores, por sinal, todas muito belas e diferentes. Descubro assim, que por mais que a velocidade do tempo me assuste, nada impede que eu recapitule os meses anteriores, admire, e logo após volte ao presente.

sábado, 8 de maio de 2010

Monólogo

Antes de você sair deixa só eu te dizer umas coisinhas, bobagenzinhas à toa, mas que preciso dizer antes que você feche a porta, para que depois você não precise voltar ou para que eu não precise te procurar [não que isso vá acontecer, é claro]. É só que, apesar de tudo, eu amei você incondicionalmente. Não, não precisa me olhar assim, eu sei que nos expulsamos da vida um do outro e não há mais retorno. Mas eu te amei sem medidas. E vou sentir falta de você sapateando com o meu juízo, fazendo do meu coração o seu brinquedo favorito. É verdade, sim. Tudo bem se você não acreditar, eu pesei tudo na balança e assumo a parcela mais salgada de culpa. Não, não é demagogia, me deixe ao menos terminar, eu quero poder acertar ao menos agora. Assumo o erro agora na sua frente e na frente de quem mais quiser ouvir. Mas isso jamais mudará o fato de que teu cheiro fez casa em mim, e tampouco pretendo me livrar dele como você está a se livrar de mim assim, com tamanha facilidade e desapego. Deixa eu te dizer que nunca mais vou dormir sozinha, porque você vai continuar a dormir comigo por noites e noites a fio. Não, não é mais uma historinha minha, não choro para angariar tua piedade, não precisamos disso, no fim das contas. Só preciso te fazer ciente de que não terminou pra mim, esse amor devia ter durado anos e eu ainda acredito nisso, muito embora tenha a certeza de que você jamais vai me tocar de novo. Deixa só eu te pedir para me cumprimentar se a gente se esbarrar por aí, um olhar, um aceno de cabeça, um esboço de sorriso. Não precisa me julgar pelo que fiz, já recebi condenação. Mas também não precisa fingir que nunca me amou, assim desse jeito que você tenta fazer agora, afinal eu conheço todos os teus caminhos. Ah, como pude esquecer? Deixa eu te avisar que essa porta nunca estará trancada, e as janelas permanecerão abertas de par em par, e essa persiana verde vai espiar as ruas todos os dias, de manhã bem cedinho, esperando você voltar. E você sabe, isso eu não preciso dizer, você sabe que pode voltar a qualquer hora, mesmo que não seja para sempre naquela eternidade de momentos que costumávamos forjar. Você ainda tem meu telefone, não tem? A gente pode só conversar. Por favor, não dê as costas pra mim, espera só mais um pouco. Não esqueça de avisar pra próxima garota que você gosta de capuccino forte, que dorme de meias brancas e limpas quando chove ou faz frio, pede pra ela tirar a poeira da sua casa todos os dias, cuida dessa sua alergia. E avisa, antes de tudo, que você não quer ser pai, não vai decepcionar a menina quando ela já puder odiá-lo. Anda sempre com um casaco na mochila, ninguém sabe quando vai chover. Incrível como continuo a tomar conta de ti, não acha? Não esqueça o aniversário dela, ou o aniversário de namoro, faça com que ela se sinta a mulher mais amada do mundo todos os dias. Do jeito que você fazia comigo. Do que você está rindo? Você fazia isso, não se lembra? Costumava deixar bilhetes pela casa, ou uma orquídea na minha mesa de trabalho sem motivo aparente, só porque me amava muito. Ainda tenho uns bilhetes guardados, olha que coisa. Tenho todos guardados, na verdade. Do primeiro ao último, uns cinco anos de história que vão para um baú. O que foi que eu fiz da gente, por Deus do céu? Como pude me forçar a me lanhar sem ti? Como pude te forçar a me deixar assim, feito nau à deriva? Não, não te preocupes, não vou chorar mais. É certo que vai doer, de uma dor diária e sem tamanho, mas a gente sobrevive, não se morre mais dessas coisas. E talvez eu não me acostume ao silêncio angustiante que produz o som de uma casa vazia de ti, mas posso colocar nossa música sempre que for preciso. Lembra dela, né? Você cantou pra mim depois daquele show, o bar vazio, não consigo tirar o retrato daquela noite da minha cabeça. Também acho que você não vai esquecer, mas parece presunçoso dizer isso, por ora devo silenciar meus pensamentos e deixar você ir. Desculpa, não dá, parece que vem tudo contra mim, em ondas, e nada conspira. Por Deus, não consigo me calar. Deixa eu te dizer que eu ainda te amo, muito mesmo, talvez agora mais do que sempre, e não é por estar te perdendo, é por saber que é irremediável. Deixa eu te pedir perdão por tudo e por isso, será que você consegue me olhar sem me odiar? Será que você pode amenizar esse peso, só um pouquinho assim, pra ver se eu consigo respirar? Isso, senta aqui do meu lado assim, não me deixa morrer agora, não sem antes saber que você me perdoa. Me perdoa então? Ah, que bom, isso muda um pouco a perspectiva. Acho que você já pode ir agora, agora que já falei tudo e você ouviu direitinho. Ou pode ficar, se quiser, claro, ia me fazer muito feliz. Você não quer ir agora? Não? Então fica aqui, fica assim, fica mais, fica pra sempre se não for incômodo. Quer me dizer alguma coisa, falei feito doida, não te dei espaço pra nada. Quer tentar mais uma vez? Só uma mísera vez, assim? Juro que te deixo ir quando quiser. Posso ficar perto de ti assim, só pra sentir teu calor? Tá frio, faz tanto frio hoje, deita aqui, assim, do teu lado da cama. Deixa eu ficar do teu lado pra sempre, deixa? Tudo bem, agora estou eufórica, deixa eu ir até ali apagar a luz

quarta-feira, 5 de maio de 2010

Meu amor eterno

Quem lê este fórum social mundial do romantismo, sabe o quanto uso descaradamente este espaço para gabar las mujeres. Sim, destino toda espécime de chamego às minhas nereidas. Apesar de nem sempre bem compreendida, peço a cá permissão para arremedar o mestre Armando Nogueira, considero esta relação harmoniosa. Mas cabe aqui um entretanto.

Certa vez fui diagnosticado por uma dessas amigas/mulheres/amantes das quais tive a sorte de sentir a fragrância no cangote e compartilhar besos na quina da orelha: meus textos abordam com assiduidade a infidelidade, um desvio de caráter do qual fui réu confesso em outras primaveras. Tudo bem, assumo: ainda sou um adepto de carteira e tudo da fuleiragem.

Por isso, peço licença às mulheres, mas hoje vou pular as vossas cercas e vou dedicar esse texto à única que nunca traí: a escrita. Reconheço que, nessa de molecote inexperiente e afobado, já tentei traí-la com a TV ou com o rádio. É a corda que se pega em virtude da profissão de jornalista. A faculdade por vezes emburrica um cabra.

Mas, a fim de me redimir da tentativa fracassada de adultério, revelarei um podre meu: brochei tanto nas relações televisas quanto nas radiofônicas. Falhei mesmo. Minha voz não é adequada, sou assimétrico com olheiras profundas e por aí vai. Não sirvo para elas. Mas mesmo assim, como quem ama do vera, a escrita me recebe de volta sem empunhar nem o categórico rolo de amassar pão e diz sobre mim: “Pobre abestado, tenta flertes fracassados e no final volta pra mim.” Nessa relação o dominado sou eu.

Todos os dias, a escrita prova que sou dela, apesar de no meu íntimo saber que nem sempre ela é só minha. E nem pode. Tantos outros em sua companhia chegam ao gozo literário. Mas não vejo um que seja com ela o tipo canalha. Isso me conforta, sabe? Nem mesmo o cafajeste dos cafas, outro mestre, Nelson Rodrigues ousou zombar dela como fazia de noivas, moças de família e demais engraçadinhas.

A escrita é quem aluga a gente, meu povo. Experimente escrever algo errado e mostrar para algum metido a sabichão. O esculacho vem na hora. É a chacota gramatical. Ela é cruel, pois se com ela gorar, ri alto na tua cara. Mas ela pode. Ela deve.

Peço licença, mas aproveito o texto para mandar um recado a essa amante eterna: Escrita, eu te amo. Sonho em viver de ti. Pra ti. Fique tranquila, não serei mais besta e tentar te trair, minha cara. Escrita, quando você chegar em casa, antes de deitar sem culpa nenhuma na consciência, dê uma checada na secretária eletrônica. Te liguei e deixei um recado com a voz sussurrante: “Amor, hoje, assim que eu regressar da batalha, quero te pegar pelas letras e te fazer mulher.”

terça-feira, 4 de maio de 2010

Reconciliação*

Partido, quebrado, lascado em cacos.
Retalhos detalhados de uma história.
Que conto, reconto e faço meu recanto.
Ah, recanto!
Onde me recolho aos amores.
Tantos ao dia, poucos em anos, enfim, algum?
Agora reparo o que de mim se partiu, sem “mas”.
Junto cada lasca e caco.
Costuro os retalhos e faço outra colcha.
De novo.

*Daniel Amaral (romântico de carteirinha)

segunda-feira, 3 de maio de 2010

A música é alimento invisível.

É incrível como uma música exerce uma intimidade profunda no nosso ser, essa junção de sons vai entrando e se instalam como espiões determinados a atacar na hora certa.

Mas esse ataque não é ruim, não pra mim.

Estava no trabalho quando uma colega começou a cantarolar uma canção que me fez parar tudo que estava fazendo, dar aquela longa e profunda olhada para o horizonte e finalmente fechar os olhos para degustar o momento em que a música me remeteu.

Lá estava eu viajando longe quando fui interrompido por uma frase “eita Isnard, ta apaixonado hein!!”. Abri os olhos, olhei para o lado, e numa defesa rápida e involuntária disse “oxe, cai fora, num posso nem curtir a música?”.

A verdade era que realmente aquela canção tinha ido bem mais profunda do que a minha resposta. A minha resposta era algo superficial, preparada, involuntária. Mas o tocar daquela canção, em mim, era profundo, nada superficial. A música tem essas coisas de fazer a nossa mente suavizar e trazer coisas extremamente intrínsecas.

A música é uma das pouquíssimas coisas em nosso mundo que transcende o material e racional, ela toca diretamente a nossa alma.

Mesmo em meio a alguns problemas e aflições que tem consumido meu pensar, nesse pequeno intervalo de tempo, aquela canção levou-me a momento bem guardadinho em minhas lembranças; piegas, mas lindo, lindo!

Era uma dança onde o visual e a sonoridade situavam juntos uma lembrança perfeita, era como um cheiro que nos leva ao exato momento do ocorrido. Era música para os olhos, balé para o coração. Uma coreografia perfeita.

Agora estava preparado para enfrentar o dia, pois, uma simples canção, cantarolada por uma pessoa com voz de funil, em um lugar de trabalho, tinha despertado sentimentos maravilhosos no âmago do meu ser.


domingo, 2 de maio de 2010

Post-it

A chuva vem fustigando a janela há alguns dias, e tem aquele silêncio morno que invade as persianas. E tem também aquele cobertor bem grosso. Tem o lençol que eu troquei ontem, aquele outro eu já deixei na lavanderia. Tem uma rotina, tem um dia-dia, tem um ser ou não ser que não é de fato. Tem um acordar diário bem cedo, levantar preguiçosamente junto com o sol. Tem um adormecer muito tarde, dormir cansada junto com a lua, que varou a noite no azul. Tem um trabalhar que cansa, e que é bom. Tem um ter você de novo. Tem a nossa música e a nossa cor, na janela, na persiana e no dia inteiro. No teu olho e no meu brinco. Tem tudo aqui, amor.

Cê precisa de outra coisa que não seja só isso?

escrito em novembro de 2007.

sábado, 1 de maio de 2010

eu me rendo

Que todas as minhas forças estejam sempre reunidas para o que é de amor. Que eu seja capaz de me iludir e me decepcionar, para que assim, o mundo acabe e eu me perca por completo. Para que eu ‘desame’, e fique sem chão e teto. E, depois disso, passe a amar novamente, como nunca. Que eu seja capaz de morrer de amor e viver unicamente por ele. Para que eu sinta, em mãos, pele e cabelo, o que realmente vale a pena nessa vida. E que eu continue a amar, hoje e sempre. Que eu me apaixone a cada dia, pelo que é eterno, pelo que é improvável, momentâneo, de pedra ou poesia, simplesmente, porque eu posso. E a amargura de lábios alheios sejam apenas convites para música, e amores partidos, contos de fadas. De mãos dadas com o amor, eu bailo em campos minados, nado por entre tubarões brancos e escalo montanhas de olhos fechados. Que Deus tenha piedade dos que temem entrar nessa dança, dos que se recusam, ou dos que, meramente, não ousam se deixam levar. Isso, porque sou uma romântica - seja das primeiras, décimas ou últimas - e serei até o fim.