domingo, 24 de julho de 2011

Dicas de um bom papo: Rio Acre


O glamour do rio



“Nem Deus afunda o Titanic” disseram alguns comandantes, provavelmente sob efeito de muito vinho e/ou espumantes, em 15 de Abril de 1912. Mal imaginavam eles, ao descer profundamente em algum ponto gelado do atlântico, que um século depois seriam homenageados na capital do Acre, em águas federais brasileiras.



O “Flutanic”, palavra oriunda da mistura de “Flutuante” com “Titanic”, que usarei aqui para substituir o mal entendido apelido, é reconhecidamente o maior ponto turístico-noturno de Rio Branco. Apesar dos concorrentes crescerem como o capim de calçada, (inúmeras boates, pubs, e botequins chinfrins) o Flutanic não perde seu status de “barquinho do amor”, nas águas do rio barrento.




Há quem prefira freqüentá-lo quando o rio está cheio, pois a distância da escadaria até a balsa é menor, e os riscos pós-bebedeira diminuem cerca de0,5%. Outros desconsideram as estatísticas, e se concentram no forró, na cerveja barata, nas danças, e ainda há quem fique curtindo a bela paisagem beira-rio, bem ao estilo “sem-frescura” – “manda mais uma”, e segue o jogo.


O rio Acre é “território” federal, supomos então, que o Flutanic seja o mais brasileiro dos bares acreanos, aliás, é restaurante também. No sobe e desce do rio, tem oferecido aos visitantes o lazer no lugar feito para ser transporte, pode ser que seja esse o segredo do sucesso. E não duvide desse sucesso que já ultrapassa o bairro da base, a capital, o Brasil, o mundo. Ilustrado com a conhecida história do um famoso cantor de rock, que ao chegar a Rio Branco, perguntou ao motorista – Onde fica mesmo o Putanic? (Errrg.. escapou..)

terça-feira, 19 de julho de 2011

Malinculia*



De Antonino Sales

Malinculia, Patrão,
É um suspiro maguado
Qui nace no coração!
É o grito safucado
Duma sôdade iscundida
Qui nos fala do passado
Sem se torná cunhicida!

É aquilo qui se sente
Sem se pudê ispricá!
Qui fala dentro da gente
Mas qui não diz onde istá!
Malinculia é tristeza
Misturada cum paxão,
Vibrando na furtaleza
Das corda do coração!

Malinculia é qui nem
Um caminho bem diserto
Onde não passa ninguém...
Mas nem purisso, bem perto,
Uma voz misteriosa
Relata munto baxinho
Umas históra sôdosa,
Cheias de amô e carinho!

Seu moço, malinculia
É a luz isbranquiçada
Dos ano qui se passou...
É ternura... é aligria...
É uma frô prêfumada
Mudando sempre de cô!

Às vez ela vem na prece
Qui a gente reza sósinho.
Outras vez ela aparece
No canto dum passarinho,
Numa lembrança apagada,
No rumance dum amô,
Numa coisa já passada,
Num sonho qui se afindou!

A tá da malinculia
Não tem casa onde morá...
.........................
Ela véve noite e dia
Os coração a rondá!...
.........................
Não tem corpo, não tem arma,
Não é home nem muié...
.........................
E ninguém lhe bate parma
Pru causo de sê quem é!
.........................
Ela se isconde num bêjo
Qui foi dado ha muntos ano...
Malinculia é desejo,
É cinza de disingano,
Malinculia é amô
Pulo tempo sipurtado,
Malinculia é a dô
Qui o home sofre calado
Quando lhe vem à lembrança
Passages de sua vida...
.........................
Juras de amô... isperança...
Na mucidade colhida!
.........................
É tudo o qui pode havê
Guardado num coração!
.........................
É uma históra qui se lê
Sem forma de ispricação!
.........................
Pruquê inda vai nacê
O home, ou mêrmo a muié,
Capacitado a dizê
.........................
Malinculia o qui é!!!




*Modo sertanejo de dizer "melancolia".

quinta-feira, 14 de julho de 2011

Feliz Aniversário Ulisses!

Compartilho com vocês, confabulações minhas e do Helder Jr, no final desta manhã, via skype:

[11:54:36] Giselle Lucena: ei
[11:54:41] Giselle Lucena: queria fazer um post pro ulses
[11:54:47] helder.jr: acho justo
[11:55:25] Giselle Lucena: vou ecsrever algo
[11:55:27] Giselle Lucena: e te mando de tarde
[11:56:54] helder.jr:
[11:57:17] Giselle Lucena: mas me ajuda a pensar em algo bem humorado
[11:58:10] helder.jr: acho que devíamos descrevê-lo
[11:58:17] helder.jr: o ulisses é uma figura
[11:58:49] helder.jr: ele é o amigo mais futurista e consevador que tenho
[11:58:54] helder.jr: tem a bunda enorme
[11:59:13] helder.jr: é corintiano, mas nunca pegou nada de ninguém (corintiano tem fama de bandido)
[11:59:38] helder.jr: ele é empreendedor e trabalhador
[11:59:54] helder.jr: e principalmente: gosta de alugar um que nem presta
[11:59:59] Giselle Lucena: ele é o romantico-empreendedor da confraria
[12:00:01] helder.jr: hahah
[12:00:05] helder.jr: isso
[12:00:05] Giselle Lucena: tá bom já
[12:00:08]helder.jr: é quem dá o gás
[12:01:22] Giselle Lucena: esses detalhes sobre o q ele dá, só tu sabe... eu não.
[12:02:30] helder.jr: ui!
[...]

É bom ter você como membro desta Confraria! Parabéns pelo seu dia, por ser quem você é e por estar conosco nesta prosa!

segunda-feira, 11 de julho de 2011

A obra prima

Tinha esfriado no final do dia. Corri pra casa e o encontrei como venho encontrando há meses: enfiado no livro. Guardei meu sorriso. Ele tinha me ligado à tarde dizendo que estava com saudade, perguntando o que estava fazendo, umas bobeirinhas assim que ele nunca tem o costume de fazer. Então eu corri pra casa e achei que a ligação e o frio iriam ajudar. Mas lá estava ele, enfiado no livro.

__ Acabou sua obra de arte?

Ele não levantou a cabeça, mas percebi que só então ele tinha se dado conta da minha presença. E respondeu entre dentes um “o que você acha?” bem mal humorado.

__ Quanto mais tempo você leva pra acabar esse livro, mais e mais ele vai acabando com a gente.

Ele suspirou. Fui pra cozinha, me sentindo a pessoa mais sozinha da face da terra. E é surreal se sentir sozinha quando se mora com alguém. Mas eu me sentia.
Vinha assim há meses. Eu entendia, ou tentava entender o máximo que eu podia. Tinha o livro, que era um objetivo pessoal que ele vinha perseguindo há anos, tinha o trabalho no banco, tinha os problemas familiares (o pai dele é uma “maravilha de pessoa”), enfim. E no meio disso tudo tinha eu. Sem família, sem grandes amigos, sem paciência pra pessoas. E tinha a gente, um relacionamento maravilhoso, a melhor conversa que já tive, o melhor sexo que já tive. E entre a gente, esse abismo.

Me perdi nos preparativos de uma sopa (pra um, os farelos de pão pela mesa me indicavam que ele havia comido) e ouvi o celular dele tocar lá do quarto. Conversa rápida, não mais que cinco minutos, e ele passou pela sala apressadamente avisando que estava de saída.

__ Vai onde? Aconteceu alguma coisa?
__ Não, só o Fábio que me ligou. Vou tomar uma cerveja.
__ Ah.
__ “Ah” o quê?
__ Nada. Só “ah”.

Tinha isso. Eu tinha tanta vergonha disso. Juro por Deus. Ele tinha todas as ocupações com o banco, o livro, a família. Ok. Quando se dava uma folga, ele escolhia qualquer pessoa do mundo pra estar. Menos eu. Deus, como isso me envergonhava.

Tomei minha sopa e me joguei na cama. “Chorei, chorei, até ficar com dó de mim”. Não vi quando chegou, só senti o cheiro pesado de álcool. Devia ser bem tarde. Ou já de manhã.

Acordei quase meio-dia e lá estava ele, imerso no processo criativo de acabar com o que eu sentia por ele. Jurei pra mim mesma nunca mais me envolver com artista bancário, de nenhuma área. Ou, se fosse o caso, me envolveria só com os músicos, porque eles pelo menos deixam claro que são cabeludos, safados e vão comer todo mundo e te fazer sofrer miseravelmente. Mas jamais me envolverei novamente com um poeta que finge ter sentimentos. Rolei na cama sem coragem e quando fui me levantar bati a perna nas costas dele sem querer. E instaurou-se o caos.

Ele me acusou de agressão. Disse que eu vinha agindo como adolescente, que não conseguia entender os processos dele, que ele tinha que cuidar da vida e que o arrastar da minha solidão pela casa não ajudava em nada. Que eu tinha que sair e arranjar umas amigas pra falar mal dele. De repente até arranjar um amante, quem sabe assim eu ficaria quieta e daria a ele o espaço que ele precisa. Disse mais uma série de coisas horríveis, que só de pensar me ruborizam a face de tanta vergonha. Eu me levantei sem chorar, sem vacilar, juntei minhas coisas numa bolsa de viagem e no momento em que pus os pés fora do prédio desabei. Chorei no meio da rua, e eu não chorava na frente de ninguém. O porteiro, seu Geraldo, ficou horrorizado. Quis chamar a ambulância, me levou pra dentro do quartinho dele, pediu pra esposa passar um café bem forte pra eu me recompor. E eu chorava copiosamente. Chorei copiosamente, na frente de estranhos, por umas duas horas.

A esposa do seu Geraldo, dona Bete, me deu um café fortíssimo e sentou do meu lado no sofá com uma cara de pena que me deu dó. Era magrinha, pequenininha, o ser humano mais frágil que já vi. Quase não ouvi sua voz quando ela me perguntou o que tinha acontecido. Hesitei, mas acabei contando como eu vi de mãos atadas meu relacionamento afundar. E de algum lugar no fundo daquela mulher frágil saiu um discurso tão duro e realista que senti vergonha. Não pelo que falei, mas por tudo que permiti que acontecesse nesses últimos meses.

Após uns dois dias a vida já tava voltando à normalidade, mas o discurso da dona Bete não saía da minha cabeça. E era justamente nisso que eu pensava quando ele me ligou. Pediu desculpas, disse que agiu feito idiota, que a casa não era a mesma sem mim, falou falou falou e eu chorei chorei chorei copiosa e silenciosamente. Disse a ele que passaria lá em alguns dias, pra quem sabe conversar, ou só pegar o que de mim restou por lá. E o fiz, naquela mesma tarde. Toquei a campainha algumas vezes, ele não atendeu, então entrei. Ele estava dormindo. No escritório, sobre a escrivaninha, o livro. Fui até a última folha e constatei que estava pronto.
Ateei fogo aos papéis. Tive o cuidado de ir até a cozinha, pegar um litro de álcool e derramar no computador, que obviamente também pegou fogo. Certamente ele teria aquele material no e-mail, mas só o fato de saber que aquilo dificultaria de alguma forma o trabalho e traria um prejuízo mínimo, me senti feliz. Me senti leve, como há muito não me sentia. Depois fui até o quarto, bati, abri um pouquinho a porta. Ele acordou com a luz no rosto.

__ Oi, amor.
__ Oi, meu bem. Sua obra de arte tá pegando fogo.

segunda-feira, 4 de julho de 2011

Entre Datas




Eu nunca fui boa com números. Sempre demoro para decorar telefones, tenho dificuldade em conferir trocos, fazer contas ou ate mesmo decorar datas. Sério, já esqueci o aniversário de todos os membros da minha família. Não é de se espantar que eu sempre me confunda em nossa história. Afinal, qual foi o final de semana que ficamos pela primeira vez? Qual foi o dia do nosso primeiro beijo? Por quantas semanas ficamos juntos? Quando foi nossa primeira briga? Quantas brigas tivemos? As lembranças vão cada vez mais se misturando na minha cabeça, e muitas vezes eu não consigo me lembrar o que veio antes do que. Fico olhando o calendário e me perco em meio aos números.

Só lembro da nossa última vez. Da última vez que me beijou. Foi no seu quarto. Da última vez que dormi em sua casa. Estava frio, mas você não quis me abraçar. A última vez que segurou a minha mão. Já era noite e pegávamos o ônibus. A última vez que me procurou. Estava inquieto e iamos sair. A última vez que me fez raiva. Almoçavamos. E sei exatamente por quantos dias estamos separados. Isso, eu não preciso nem contar nos dedos. Essa é a unica conta que eu não me perco. Não esqueço, por mais que queira, a data do nosso fim.

A verdade é que eu guardei todas as nossas despedidas. Fico cuidando delas porque é a única coisa que me restou. Quando elas começarem a desaparecer, quer dizer que acabou. E eu não sei se já estou pronta para superar você.

sábado, 2 de julho de 2011

O primeiro beijo - o último encontro

Era a quarta série e você deve ter sido o meu primeiro melhor amigo. Tínhamos uma amizade delicada: você se sentava à minha frente, trocávamos lápis de cor e dividíamos o lanche. Você, inclusive, me deixava cuidar do seu “tamagotchi”, até eu ter o meu e a gente cuidar do “filhotinho” um do outro. Posso dizer que era amor do nosso jeito? Na quinta série, veio uma vontade inexplicável de te beijar. E foi na saída de uma aula qualquer, na garagem da escola, que nossos lábios se tocaram e, antes mesmo que abríssemos os olhos, eu – logo eu - te pedi em namoro e você aceitou.

O caminho daquele Colégio Meta I até o escritório do meu pai, de repente, ficou muito estranho. Eu fiz uma caminhada saltitante, leve e, ao mesmo tempo, cheia de medo: será que estava escrito na minha testa que eu acabara de dar o meu primeiro beijo e tinha agora um namorado? Qualquer reação podia ser suspeita... A tarde foi longa, muito longa, muito, muito, muito longa, longa o suficiente para eu chorar perdidamente e me arrepender do pedido que fizera. Me arrependi a ponto de inventar uma mentira e ligar para minha melhor amiga de então – que tinha acompanhado tudo, desde a minha decisão até o fato consumado – e pedir para que ela desse um recado a você: o namoro estava cancelado. Inventei que tinha recebido uma mensagem do além dizendo que aquilo não podia continuar, que estava tudo errado e que um dia nós iríamos entender. Afinal, era a quinta-série, e eu lá sabia o que significava estar namorando, só sabia que não estava pronta praquilo e nem tinha jeito para explicar.

Naquela aula seguinte eu poderia ter fingido uma dor de barriga, forçado algum vômito ou ter paralisado o pé e ficado em casa. Mas não: eu encarei o mundo. Na escola, todos já sabiam do nosso beijo e você passou por mim com um ar boçal que eu nunca tinha conhecido, acompanhado por todos aqueles garotos bobos e idiotas. Minha amiga ficou de dar o recado, mas não conseguia; você, afinal, não queria ouvir a ninguém, apenas curtir o seu momento. Eu fiquei na minha...

Quando a minha amiga te contou que eu não queria mais namorá-lo, você ficou puto e mandou me dizer para nunca mais olhar na sua cara. Exatamente assim. Senti um alívio estranho. Afinal, não estava mais namorando, mas, também, acabava de perder o meu primeiro melhor amigo. De qualquer forma, meu coração ficou tranqüilo, como se soubesse que te guardaria sem dor. Não estudávamos mais juntos e você passou para o turno da tarde. Desde então, nunca mais nos falamos nem nos vimos. E a vida foi passando... (assim como outros beijos e namoros iniciados e inexplicavelmente mal-acabados...)

Cerca de 12 anos depois, é num almoço rotineiro lá no O Paço, que eu te vejo. De blusa listrada, boné escondendo os cabelos lisos que caíam sobre os teus olhos (eu os achava tão lindo: os cabelos e os olhos...). E você ainda de aparelho nos dentes! Você chegou com uma garota loira, de cabelos cacheados, que talvez seja a sua namorada ou qualquer outra coisa. Mas, eu ainda poderia olhar na sua cara?! Eu sei que você me viu, mas eu virei o rosto sabe-se lá por quê. Talvez você nem me reconhecesse. Talvez você percebesse que eu já fui mais bonita ou notasse o quanto meus seios cresceram. Mas eu não poderia sair dalí sem alguma certeza, e sem te mostrar que ainda lembro.

Esperei os nossos olhos se cruzarem mais uma vez e, quando menos esperei, você piscou com um dos seus olhos castanhos e deu um sorriso discreto com o canto da boca. Não seria mentira e muito menos exagero dizer que foi um momento pleno e singelo onde tudo à volta congela e desaparece. Eu queria poder te contar do que eu não esqueci. E da leveza que o seu sorriso e aquele seu olhar (que, eu sei, viram também uma história) me proporcionaram naquele momento.

Eu fiquei com um sorriso bobo, revivendo coisas e imaginando outras... Foi então, que meu irmão fez alguma piada comentando que eu estava rindo sozinha. Sim, eu estava, afinal: lembrar do nosso primeiro beijo – que foi também o nosso último encontro - é sempre bom. Agora, poder lembrar também do nosso mais novo último encontro, será melhor ainda.